Filhos de Bolsonaro agem para frear ‘voo presidencial antecipado’ de Tarcísio diante da hesitação de ex-presidente
Flávio criticou antecipação da disputa pelo Planalto, enquanto Eduardo e Carlos fizeram ataques velados ao governador

Às vésperas do início do julgamento da trama golpista, a hesitação de Jair Bolsonaro em apontar seu herdeiro político em 2026 abre brecha para que o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), um dos cotados, e dois de seus irmãos, o deputado Eduardo e o vereador Carlos, façam movimentos para brecar um possível voo presidencial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). O senador afirmou na quarta-feira à colunista Bela Megale, do GLOBO, que a chance de sucesso de um presidenciável diminui “ao antecipar tanto assim a disputa” — em recado velado a Tarcísio, que vem adotando postura de candidato ao Planalto nos últimos dias.
Carlos, por sua vez, criticou governadores de direita que “fingem normalidade” antes do julgamento de Bolsonaro e sugeriu apoio a uma candidatura do irmão Eduardo à Presidência. Já o deputado, que está nos Estados Unidos desde fevereiro, acusou de “chantagem” outros integrantes da direita que “falam em substituir” o pai na urna.
Reservadamente, lideranças do PL avaliam que a movimentação de Flávio está alinhada com o pai. Diante da chance de ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe de Estado e de passar um longo período inelegível, Bolsonaro procura manter publicamente o discurso de que será candidato. O cálculo é o de, mesmo fora da urna, não perder as rédeas da oposição ao presidente Lula.
Na mesma toada, Flávio disse que “não é hora de tratar Bolsonaro como carta fora do baralho, nem de fazer festa”.
— A eleição será daqui a um ano e meio. Desconheço algum candidato à Presidência que tenha obtido sucesso ao antecipar tanto assim a disputa. Normalmente, ninguém aguenta tanto tempo de fritura e acaba se queimando — disse à colunista Bela Megale.
A declaração de Flávio ocorreu na mesma semana em que Tarcísio participou de um jogo de futebol festivo com outros políticos de São Paulo e, em uma palestra a empresários, sugeriu o lema “40 anos em quatro” para um futuro governo que derrote Lula em 2026. No mesmo evento, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, afirmou que articula a filiação de Tarcísio ao partido caso o governador de decida disputar a Presidência.
A fala de Valdemar irritou Eduardo. Segundo a colunista Bela Megale, aliados do deputado afirmam que ele deixará o PL e disputará o Planalto por outro partido, contra Tarcísio, caso o governador atenda o convite de Valdemar. Nas redes sociais, Eduardo argumentou que a “pressa” em apontar um sucessor do pai teria o objetivo de “forçar Bolsonaro a tomar uma decisão da qual não possa mais voltar atrás”.
Diante da repercussão, Valdemar foi a público ontem afirmar que o candidato do PL à Presidência em 2026 “é Jair Bolsonaro ou quem ele, e só ele, escolher”. Além da tentativa de colocar panos quentes, a declaração foi interpretada por outros caciques do partido como recado de que as movimentações do presidente do PL são combinadas com Bolsonaro. Valdemar foi autorizado pelo STF a visitar o ex-presidente, em prisão domiciliar, hoje.
Eduardo, por sua vez, está proibido há mais de um mês de manter contato com o pai, já que ambos são alvos de inquérito por coação da Justiça. Mensagens obtidas pela PF mostraram que, antes de cessar o contato, eles discutiram de forma áspera após uma entrevista em que o ex-presidente chamou Eduardo de “imaturo” e fez elogios a Tarcísio.
A avaliação no PL é de que Bolsonaro considera Tarcísio e, por isso, tem desautorizado sua fritura. Há a expectativa, no entorno do ex-presidente, de que Tarcísio, se eleito, conceda indulto a Bolsonaro de eventuais condenações.
Por outro lado, parte dos interlocutores frequentes do ex-presidente bate na tecla de que o governador não teria disposição para bater de frente com o STF. Um dos principais críticos de Tarcísio é o pastor Silas Malafaia, que virou alvo do inquérito da PF após a descoberta de mensagens em que incentivava Bolsonaro a confrontar decisões.
Malafaia é também um dos que alimenta a ideia de que o ex-presidente lance alguém da própria família. Em conversa com Bolsonaro no início de julho, revelada pela PF, ele elogiou Flávio por defender uma anistia para o pai. E chamou Eduardo de “babaca” e disse que o deputado estava “parecendo (agir) contra”.
Em outra frente, Carlos criticou, na terça, governadores “da chamada direita” pelo que chamou de “completa falta de humanidade com quem os possibilitou alçar voos”, em uma referência ao pai.
A matéria original está publicada na edição online de O Globo e pode ser acessada pelo link a seguir: