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Amazônia

Estudante bisneto de fundadores da Bemol induz a retomada do cultivo de tubérculo ‘esquecido’ da Amazônia

Eli Minev Benzecry,é destaque do Empreendedor Social 2025 na categoria Jovens Transformadores pelo Clima

Dale-dale na Bolívia, chufle na Guatemala, airén na Costa Rica e ariá no Brasil, o tubérculo ganhou uma infinidade de nomes, inclusive por parte dos povos originários que o consomem há pelo menos 9.000 anos nas porções central e sul do continente, como sugerem evidências arqueológicas.

Ele está na América há séculos. Com sua casca bege e seu miolo esbranquiçado, de textura semelhante à da batata, serviu de alimento a indígenas e ribeirinhos da Amazônia em tempos de escassez, quando secas prolongadas e chuvas tornavam a caça e a pesca impraticáveis.

Nas últimas décadas, no entanto, o alimento que encanta o paladar com seu sabor naturalmente salgado desapareceu dos mercados e feiras de Manaus (AM). Um jovem de 17 anos, Eli Minev Benzecry, está tentando mudar isso.

Integrante da quinta geração de uma família judaica que migrou do deserto do Saara para a região amazônica no século 19, durante o ciclo da borracha, o jovem manaura iniciou um projeto de valorização cultural do tubérculo, que já o reintroduziu em nove municípios do Amazonas.

Foi nos jantares de Shabat, o sábado judaico, que Eli ouviu falar dos sistemas agroflorestais, técnica que empregaria mais tarde. Todas as semanas, a família proeminente de empresários do estado se reúne para a tradição, tendo como assunto recorrente a valorização da região.

Nessa jornada, ele aglutinou desde pesquisadores, como Noemia Ishikawa, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), até chefes de cozinha estrelados, como Alex Atala, conhecido pela valorização de produtos genuinamente brasileiros.

A seguir, Eli conta sua trajetória para reintroduzir o alimento, que incluiu a escrita e lançamento do livro “Ariá: um Alimento de Memória Afetiva”, finalista do Prêmio Jabuti Acadêmico na categoria “ilustração”.

“Minha família tem uma ligação forte com a Amazônia. O pai do meu bisavô, que veio do Marrocos, foi seringueiro. Meu bisavô lecionou economia na Ufam (Universidade Federal do Amazonas) e escreveu diversos livros sobre a região. Mais tarde, fundou a Bemol [empresa de varejo], junto aos irmãos.

Cresci vendo de perto a realidade e os desafios enfrentados pelos povos daqui, especialmente durante as secas, quando os rios, que são como as ruas de uma cidade, desaparecem, deixando comunidades isoladas, muitas vezes sofrendo com insegurança alimentar.

Em 2022, transformei um campo de futebol abandonado na zona rural de Manaus em um sistema florestal com diversos cultivos, como banana e açaí.

Queria gerar um impacto maior para a população local com aquilo, então decidi catalogar tudo o que havia plantado, para me ajudar a pensar nos próximos passos.

Ao ver essa lista, minha avó comentou que conhecia um dos cultivos, o ariá. Ela se lembrava de comê-lo quando era criança, mas não o encontrava mais para comprar.

Eu e a professora Noemia Ishikawa, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), que me abriu as portas para o universo da pesquisa etnobotânica, montamos um grupo multidisciplinar para estudar esse tubérculo.

Fizemos uma descoberta importante: ele tem nove aminoácidos essenciais, que o corpo humano não produz [dos 20 tipos existentes, o organismo sintetiza apenas 11 desses compostos responsáveis por formar proteínas].

Outro diferencial do ariá é sua resistência à seca, de modo que pode ser uma alternativa para as comunidades tradicionais da região. Nos questionamos, por que, então, ele não era mais consumido.

Nossa pesquisa levantou duas hipóteses sobre seu desaparecimento. Na cidade, ele caiu em desuso porque as pessoas não valorizam o que é local, preferindo batatas de outros lugares, como a inglesa.

Já nas comunidades tradicionais, o ariá era comumente associado à pobreza, por ser consumido quando não havia pesca ou caça.

Entendemos que, por meio da popularização científica, poderíamos mudar essa percepção. Para isso, escrevemos o livro “Ariá: um Alimento de Memória Afetiva” publicado em dezembro de 2024. A obra traz dados científicos, histórias e memórias sobre o ariá, além de receitas criadas por chefs como Alex Atala.

A matéria original é uma publicação da Folha de São Paulo online e pode ser acessada pelo link a seguir:

https://www1.folha.uol.com.br/folha-social-mais/2025/09/estudante-induz-a-retomada-do-cultivo-de-tuberculo-esquecido-da-amazonia.shtml
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