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Na contramão do STF, Senado aprova PEC que criminaliza posse e porte de drogas; entenda o que muda

Texto segue para a Câmara dos Deputados e, caso aprovado, Supremo pode ser acionado por quem considerar nova legislação inconstitucional

O Senado decidiu na noite de terça-feira se antecipar a um julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) e aprovou em dois turnos uma proposta para incluir na Constituição a criminalização da posse ou do porte de drogas, independentemente da quantidade. O texto segue para a Câmara dos Deputados.

No Supremo, já há 5 votos a 3 para descriminalizar a posse e o porte de maconha, e se discute o estabelecimento de um volume específico para distinguir usuários de traficantes. No Congresso, o texto sobre o assunto ficou conhecido como Proposta de Emenda à Constituição (PEC) das Drogas, e teve amplo apoio em plenário. Na primeira votação, foram 53 votos a favor e 9 contrários. Na segunda rodada, o placar foi de 52 a 9.

Se o projeto for promulgado pelo Congresso, mas o STF decidir pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, valerá a mudança na Constituição aprovada no Legislativo. O Supremo, no entanto, pode ser acionado por quem considerar nova legislação inconstitucional.

— Algum representante legitimado, como o presidente da República, as Mesas Diretoras de Senado e Câmara ou um partido político com representação no Congresso, podem propor uma ação direta de inconstitucionalidade. Neste caso, o poder de decidir sobre a matéria retorna ao STF — afirmou o advogado constitucionalista Gustavo Sampaio.

Para o constitucionalista, a PEC traduz uma reação da maioria conservadora do Congresso à interpretação traçada pela jurisprudência do STF.

— Com a criminalização sendo elevada ao patamar constitucional, encerra-se a validade da inovação jurisprudencial trazida pelo Supremo, quando decidiu em habeas corpus pela inconstitucionalidade do dispositivo da Lei de Drogas que considera delito a posse de entorpecente para fim de consumo pessoal — explica Sampaio.

Diretor do Justa, organização que atua no campo da economia da justiça, o advogado Cristiano Maronna afirma que a aprovação da PEC não impede que o Supremo continue a analisar a pauta das drogas.

— O STF pode declarar a PEC como inconstitucional se a Corte entender que a criminalização contraria as garantias constitucionais da privacidade, intimidade e proporcionalidade — avalia.

Julgamento continuará

O porte de drogas já é crime segundo a atual Lei de Drogas, de 2006, mas que não é punido com prisão, ao contrário do tráfico. A lei deixou em aberto qual seria o critério objetivo para distinguir usuários de traficantes. Por isso, o Supremo passou a analisar a questão.

No plenário, o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA) liberou a bancada. Segundo parlamentares, o governo não interferiu porque havia o entendimento de que a aprovação já era dada como certa. Quando tramitou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o texto foi endossado por uma votação simbólica.

— É uma questão de consciência individual — afirmou Jaques Wagner.

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O PT foi o único partido a orientar contra a aprovação. O MDB liberou a bancada, e os outros partidos encaminharam a favor da proposta.

A PEC é do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O projeto prevê ainda que seja “observada a distinção entre o traficante e o usuário pelas circunstâncias fáticas do caso concreto, aplicáveis ao usuário penas alternativas à prisão e tratamento contra dependência”.

No Supremo, ministros têm sinalizado de forma reservada que o avanço da PEC não vai interferir na continuidade do julgamento sobre o tema. Na leitura dos magistrados, o Senado está agindo de acordo com o seu dever constitucional, e apreciando um tema como qualquer outro.

O julgamento na Corte foi paralisado após um pedido de vista do ministro Dias Toffoli, que deve liberar o caso para pauta até junho. Toffoli tem sinalizado que apresentará um voto meio termo.

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